Desconectando para Reconectar: uma Jornada do Caos à Serenidade

No final do ano, eu estava me sentindo muito próxima à beira do abismo do burnout: uma exaustão do corpo e da mente, um cansaço que não tem descanso possível e em que você já acorda esgotada. Na sombra do estresse e da falta de ânimo, estava desejando férias como nunca, embora ame meu trabalho.

Nesse estado, eu me via algumas vezes e de modo paradoxal, por puro cansaço, gastando tempo com a rolagem de telas nas redes sociais, vendo postagens de pessoas que sigo sobre assuntos que me interessam. Como o algoritmo envia mais postagens sobre os temas de perfis que não sigo, isso poderia se transformar em um looping infinito. Não demorou a perceber que este gesto automático, mesmo que por um curto período do dia, estava contribuindo para o ciclo de sobrecarga mental no qual embarquei devido ao excesso de imagens e informações. E de telas. Afinal, meu trabalho é todo o tempo em frente a uma. Então, eu entendi o óbvio, quase como se fosse uma epifania:

Descansar com o celular na mão não é verdadeiramente um descanso.

É preciso lembrar que as redes sociais e os algoritmos foram intencionalmente criados de um modo a produzir uma constante descarga de dopamina no nosso cérebro, hormônio que quando liberado produz sensações de prazer e satisfação. E que esse sistema alimenta a economia da atenção, de modo que quando estamos utilizando as redes sociais, produzindo ou consumindo conteúdo, estamos trabalhando para a manutenção desse sistema e para quem lucra com ele.

Essa é a lógica piramidal em que trabalhamos de graça criando ou vendo conteúdo nas redes sociais buscando receber nosso quinhão na economia da atenção.

A captura do marketing digital e a obrigatoriedade de manter a constância de postagens na rede social profissional porque “quem não é visto não é lembrado” vai minando a energia, consumindo o tempo e sufocando a criatividade. Há algum tempo eu estava sentindo que até minha escrita estava capturada por essa lógica mercadológica, o que me levou a buscar cursos de escrita criativa, quando encontrei as vivências da Geruza Zelnys: “Escrita Curativa” e “Esquizoestórias” (esse último curso se materializou em um livro coletivo do qual participo, publicado pela Editora Fábrica de Cânones e lançado na Flip 2023 pela Casa Pagã).

Eu vinha sentindo que com as redes sociais minha escrita se tornara somente intencional, perdendo seu caráter intensivo, poético e inventivo.

Diante desse quadro, decidi fazer uma experiência radical: um detox de telas, algo que eu costumo recomendar para minhas clientes que sofrem de ansiedade e outros sintomas como insônia e compulsão. Eu decidi enfrentar o dragão digital engolidor de tempo: desinstalei aplicativos e rede sociais, silenciei notificações e fiquei menos disponível nos chats.

Eu abri espaço para o silêncio e a paz mental.

É preciso dizer que para a manutenção da minha saúde mental eu já tenho o hábito de manter o mínimo de notificações possíveis no celular, que fica sem som o dia todo. Mas sua demanda por atenção é grande, porque hoje temos tudo nesse pequeno aparelho. E o meu, como o da maioria dos profissionais liberais, é como meu escritório, com direito a assistentes em forma de aplicativos de agenda e de gerenciamento de tempo e de tarefas. Mas como estava de férias, me propus a não usar nenhum deles, de modo que passava muitas horas sem sequer olhar o celular e só o fazia uma ou duas vezes por dia para verificar mensagens.

Os primeiros dias sem redes sociais, sem postar e sem ver notícias foram difíceis, tenho de confessar. Não imaginei que isso aconteceria comigo, mas não estou imune e logo caí na armadilha do F.O.M.O. (fear of missing out), o medo de ficar de fora, de perder alguma informação importante ou de cair no ostracismo, o que muitas pessoas me relatam na clínica. Isso é o resultado da constante pressão para estarmos online, o que já sabemos o quanto afeta a nossa saúde mental, mas raramente fazemos algo com relação a isso.

O uso constante de telas traz inúmeros prejuízos a saúde, tanto físicos como fadiga ocular, distúrbios de sono, problemas posturais, e LER (lesão por esforço repetitivo) e mentais como ansiedade e estresse, depressão, isolamento social, vício digital e desconexão emocional. De modo que é altamente recomendado que se faça pausas quando se trabalha constantemente com telas. Então, se você está experimentando qualquer um desses sintomas acima, além de compulsão por compras ou jogos de celular, perda de sentido existencial e baixa autoestima, eu recomendo fortemente que faça essa experiência por um período, mesmo que curto, e observe como se sente.

No início, você pode experimentar um aumento da ansiedade, de sensação de isolamento e até mesmo de solidão. É um bom momento para verificar seu nível de dependência de redes sociais e do contato online em detrimento do presencial. É preciso lembrar que as redes sociais tinham como objetivo inicial aproximar pessoas que estavam fisicamente longe, não afastar as que estão perto.

Insistindo e resistindo por um período maior e buscando investir em atividades e companhias que lhe dão prazer, alguns desses sintomas tendem a diminuir. E outros até mesmo podem desaparecer durante um longo período sem redes sociais ou aplicativos de jogos de celular. E se isso lhe parecer muito ousado, talvez possa fazer o experimento por períodos mais curtos e observar como se sente.

Eu conheço mais de uma pessoa que não tem rede social há uma década e elas estão bem, acredite. Estar longe das redes sociais não resolve todos os problemas afetivos dessas pessoas, mas certamente não cria novos problemas.

Voltando a minha experiência, à medida que as horas sem tela se acumulavam, fui notando uma grande transformação. Eu que há muito não estava tendo foco para ler um livro inteiro, reencontrei tempo para a leitura e li logo cinco em seguida no prazo de três semanas. Aumentei o tempo das caminhadas diárias, cozinhei com tranquilidade, ouvi música, dancei. Essas práticas foram reacendendo a chama da criatividade e eu voltei a escrever um projeto de romance que estava na gaveta há anos.

No final dessas semanas, os resultados se tornaram muito visíveis: a serenidade substituiu a ansiedade, a criatividade está fluindo livremente, estou mais conectada com meu companheiro, nossas conversas se tornaram mais longas e profundas. E a vida real parece ter ganhando um novo colorido, quase como se tivesse um filtro [ou exatamente por não ter].

Por necessidade profissional, eu voltei a postar nas redes sociais, porque hoje em dia é nelas que nós nos fazemos visíveis ao outro e nos colocamos disponíveis ao encontro. Mas de forma mais desprendida e mais leve, sem a obrigatoriedade de estar diariamente postando ou interagindo.

Compartilho essa experiência com você como um convite à busca de uma vida menos virtual e mais real, como um chamado a uma nova realidade. Desconectar não é somente se afastar de telas ou das redes sociais, mas se reconectar com o que realmente importa: você, os outros e o mundo ao seu redor.

Espero que essa minha pequena jornada inspire você a encontrar esse equilíbrio na busca por uma vida mais plena.

Abraços de elevar!