O que aprendi com minhas plantas.

Em um pequeno espaço confinado, entre prédios e casas, mas com muita luz, onde o sol incide somente no alto verão, decidimos cultivar um mini jardim e preparamos um canteiro no entorno do muro. Trouxemos algumas plantas em vasos e outras plantamos em cerca de 10 cm de terra. Colocamos um bebedouro para os beija-flores e com um mínimo de intervenção, passamos a observar a vida crescer e a natureza eclodir sem reservas ou timidez, onde antes era somente um quadrado de cerâmica marrom.

Plantar um jardim é convidar a vida a florescer. Aprendi que a vida acontece mesmo quando não estamos olhando e que a natureza toma conta de tudo com avidez, se lhe for permitido.

Algumas plantas são mais imperiosas e exuberantes, outras levam tempo para encontrar seu lugar. Entre elas há aquelas que são verdadeiros fertilizantes, parecendo existir tão somente para cuidar da saúde da terra, criar sinergia e trazer recursos para o sistema como um todo. Tendem a desaparecer natural e misteriosamente quando cumprem sua missão.

Essas plantas são chamadas injustamente de ervas-daninhas, mas também planta espontânea ou planta indicadora. Consideradas invasoras e prejudiciais, segundo o conceito antropocêntrico, por atrapalhar o cultivo de alguns alimentos, muitas vezes são responsáveis por recuperar solos e iniciar vida em um ambiente degradado.

No jardim de casa, houve o tempo dos casulos de mariposas. Houve o tempo da presença dos caramujos, que atraíram os pássaros, que fizeram um ninho nunca usado, que atraíram outros pássaros que vêm roubar pequenos galhos ou folhas para fazer seus próprios ninhos. Há um pé de manga que não faço ideia de como surgiu e que tivemos de retirar porque suas raízes vão ganhando espaço e um abacateiro que eclodiu de um caroço plantado em um vaso.

A espada de São Jorge cresceu a olhos vistos e está quase da altura do muro. Os lírios brancos quase morreram, mas se recuperaram quando uma planta espontânea cresceu entre eles. As maravilhas, que antes eram rasteiras, andam crescendo como arbustos e uma planta que não sei o nome eclode belas flores brancas e rosas que se assemelham a um buquê de noiva.

A jiboia, com suas folhas gigantes, insiste em querer ultrapassar os limites do jardim e invadir a vila localizada atrás do muro. Há uma trepadeira que intenta escalar o prédio, o fícus já está quase na altura da janela do apartamento de cima, enquanto o bougainville se recupera e lança seus galhos em direção a grade da janela do quarto. Todas crescem verticalmente, com resiliência, buscando a luz do sol. E assim vai crescendo nossa pequena floresta.

Ter a possibilidade de observar um jardim florescendo durante minhas horas de trabalho ou descanso, ver a vida acontecendo cotidianamente, me ensinou muito sobre nossa própria natureza e o quanto podemos avançar, centímetro por centímetro, para uma vida mais livre, potente e exuberante.

Para que sua vida floresça, é necessário cultivo, dar atenção a si mesma, colocar o foco em seu autocuidado, cultivar seus desejos e aprendizados. Cada um dos aspectos de sua vida poderá germinar, florir e dar frutos, à medida que você vai dando espaço para que se manifestem, que você vai cuidando da qualidade do seu solo psíquico e seu campo emocional e aprendendo a prover suas próprias necessidades.

Assim como as plantas buscam a luz para crescer, chegou o tempo em que quis trazer à luz as minhas reflexões, experiências e aprendizados no acompanhamento do percurso de diversas mulheres e compartilhá-las com outras, criando uma rede de afeto e afetação mútuas.

Para mim, cada percurso que acompanho é como uma terra que se estende diante dos meus olhos, com diferentes graus de desgaste e sedimentação. Sobre ela, cria-se um campo relacional como uma zona de abertura para que a luz possa passar, iluminar, aquecer e nutrir o solo psíquico e o campo emocional e eles possam voltar a florescer em toda a sua grandeza. O Percurso se torna um convite ao auto florescimento.

Nessa prática de jardinagem em dupla, vamos entendendo a qualidade do solo psíquico, o grau de erosão emocional, as áreas devastadas, as ervas daninhas que indicam o que é preciso retirar, o que é preciso incluir para que a terra possa, então, voltar a germinar.

Nesse trabalho de escavação, vamos descobrindo os ossos enterrados, separando os que precisam ser incinerados para que suas cinzas possam servir de nutrientes para o solo psíquico e quais precisam ser animados para voltar a viver, tal qual a mulher selvagem no conto La Loba.

Em um dos percursos que acompanhei, o da artista e designer Marceli Mazur, que em decorrência das demandas da vida se distanciou de seu daimon, neste caso a própria arte, eu vi renascer o desejo de criar e a capacidade criadora ser resgatada e ativada.

Deste percurso e nossa parceria nasceu, em 2019, o Florescer, a arte do auto florescimento: uma jornada para semear seu futuro.

O Florescer não é um projeto fechado e tampouco acabado, é por si só um percurso compartilhado e que se encontra em processo, em pleno acontecimento, assim como o jardim de minha casa.